quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Melancolia desastrada


Desperta desespantando-se de todo. A noite dos aforismos é para poucas inspirações de fé. Tem fé o fortemente amparado pelas lâminas de seus anjos encaminhados. De seus cantos entoados em favor de um pequeno corpo fechado: eu tenho certeza. Veja um brilho inicial-fim, mas faltavam-me palavras de consolação ao consolador, basicamente. Granulados de mortezinhas vêm vez ou outra procrastinarem os meus ouvidos, pois, já que anda a vida sem acontecimentos triunfantes, ascendem os delírios como Maria aos céus de dentro de mim. Eu os aceito educadamente. Palavrinhas-espantalhos essas, cheias de frondosas asas as que voam rumo aos jogos de sentidos entrecruzados e à primazia das expressões compostas, nascidas da ausência teórica pronta. Maior que a liberdade é o abraço-sonífero de meus sonhos. Desde então eu creio nos esquizofrênicos, pois em alguns de seus relatórios, há um pedido de socorro quase sintático, ali onde a anestesia ainda não faz parte. Eu prefiro lá, em que tudo são micro-códigos desregrados-desgarrados. Interrompamo-nos no auge do que nunca chegou até lá, pois, tudo o que se replica, pende dolorosamente aos fracassídios e se enremela involuntariamente na curvatura dos olhos outrora tão promissores, tão sinuosos, tão. E se, ao passo que pequenas deformações são férteis e insistentes, as mais inquestionáveis belezas apenas se canonizam: unicidade no tempo e no espaço. Notas de lamentação.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

In: autoajuda, só que não


Deram-lhe a terceira anunciação de falências. Cavaleiro quarto de deus na terra, responsável pelo encaminhamento ao corredor das despersonalizações demoníacas daqueles imaculados de passionalidade, de cujas sensações foram vidas sinestésicas, de cujas expressões foram saguões cheios de vácuos simultâneos. Senhores de gemidos nunca vindouros e de micro-sismologias enganosas que se engendraram no buraco de um ventre-inspiração nada frutuoso. Tudo paulatinamente largando mão de ser custoso aos olhos de serem lacrimosos, aos peitos de serem cardiopatas, as sudoreses de serem molhadas e constrangedoras. Tudo pendendo cabeças pensantes de torturas. Não para o espaço da mediocridade galopante. Um suspiro-moinho de espíritos mesquinhos e cíclicos. E retornantes para nossas habilidades o mínimo artísticas e emocionais. No âmago, no âmago era de covardiazinhas de que a vida ia se alimentando. Compulsivamente, amargamente. Coisas d’antes jamais outrora inexoravelmente desgarráveis, se mesclando se mesclando penetráveis então. Outras tantas, porém tão Superbonderes implicadas, dissipando-se como quem perguntasse: mas o que antes nos colara tanto, a ponto de um só sermos? Onde anda o curvo tempero de nossas excitações. Sê tórrido o pegamento, ao passo que o coração de formas calvas se abocanhava pequenininho e seus sofreres. Tira-o de mim, antes que todos nos emburreçamos fatalmente. E nos imerjamos no leito de babas, pois nos secarão as fontes das palavras de amores e de intelectualidades. Um tracejo enormemente planejado dentro de cada uma das estrelas que caem. Somos os apocalipses em cada respiração. Somos os contornos novelosos de serpente penduradas em pescoços. Tudo nasceu de um uivo pelo abismo que se abria desde infante, e se arreganhava. Inicialmente, o onírico era uma luz meio rochosa, fala-se da vontade voluptuosa de comê-la, de que ela coubesse e se deitasse sobre nossas superfícies tão materialmente apegadas às possibilidades duais de se aperceber. Hoje dirá não reside mais tenuidade nisso tudo. De vez em outra, os fantasmas se alternam com os terrores apalpáveis. Diz-se qualquer assunto da aceleração controlada do pensamento. Da sequência das imagens mentais e dos tremores nas pontas do dedo. Esse é o tempo, misterioso curandeiro de hoje para amanhã. Interminável o que preenche as ausências e as certezas dos que nunca mais voltarão aos ninhos amantes originais. Incertos os que viverão sustentados e impetuosos em busca da supressão do in. Plagia-se assim, despudorosamente, que mais uma vez teria sido melhor ter ido ver o filme do Pelé.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Em terra de vaga-lumes, abajures também se queimam


Ainda sobre o imenso empenho de nada. Eu e minha imensa paixão pelas sugestões de vida cada vez esbranquiçadas nas flores da mente. O tempo vem passando e houve algumas noites em que parecia que ele não passava nunca. Ali parado, com olhos ressacosos de Capitu, mas enquanto isso ele passava sorrateiro à minhas impercepções de coisas práticas. À minha única conclusão de que os seres humanos se extinguirão, em favor de cridos em sua insuscetibilidade, apenas. Pense então em mim como a mesma sensação das gotículas. Observe que quando o líquido se vê coagido a sólido, ele corre corre até o ponto mais áureo do cubo, mas ele vai se imobilizando, se imobilizando. Ele já sabe que a vida recomeça em forma de arestas mais duras, menos jocosas e mais vulneráveis. Os pequenos fracassos e seus desfiladeiros inexoráveis: tão escorregadios todas as vezes que nos vêm à tona. Nem sabemos a razão do pontiagudo da dor que causa: mas que terra é essa o coração? Pena há vida passando em tudo. Pena há sangue brotando. E pena todo aleijado tem muleta. Tem o lugar do pensamento, das paixões e das defenestrações fictícias. Mas a grande questão é: de que vale um coração? Como saber o que há de beliscões em pesadelos cada vez mais vívidos? Há uma parede invisível-visível magnífica e insaciável sendo plantada. Mas de onde vem o bloqueio-mãe, ninguém ainda se arrisca. Apenas anda-se circularmente, ao passo que a vida vem se encarregando de que todas as alternativas de escavação de túneis sejam tampadas, até que a maratona seja vencida redonda. Não há mais saídas, mas há uma fobia enorme de que o mundo dê voltas e de que a boca do sapo nos espere. Sob a égide de um imenso pedregulho, incomunica-se, e na porta-pequena-do-mundo-sem-porta, pequenas conversas montam rigidamente seus blocos, mas na hora de se ejacularem, não se sabe o porquê ali elas se entalam, elas se atropelam, elas se engolem. Um câncer de uma vida inteira toda à espreita. Uma série de contravenções lá d’alma vem se acumulando e o som cada vez mais estridente, penso que os tímpanos se explodirão por conta própria. Em forma de nuvem, se esfumaçarão. Um pequeno papel branco é a ponte desse abismo sinuoso e sonolento que se exacerba. A vida, as outras coisas e seus pequenos buracóides. Prometo que não há vaga-lume mais prestes a se queimar do que os abajures conduzidos pelas carnes em dias tão desorientados. Pobrezinhas. 

sexta-feira, 18 de maio de 2012

"De que são feitos os colares de pérolas?"


É debaixo da boca da noite que os corações mais fadigados repousam. É sob o luar que pequena ostra espia o pecado de viver entre os outros. Desculpe-me, mas é lá que estou; por entre os ouvidos musicados da pequena ostra. As canções da pequenina são abafadoras, é um bate contínuo no meio do cérebro. Quem fez isso, disso? A convicção da pequena ostra me comeu, cada vez mais generosa, cada vez mais alarmante, cada vez mais hipocondríaca. Pequena fora dela, eram só pérolas. Uma série de obséquios engasgados diretamente anexados ao enfeite de seu caixão final. Lá dentro erra-se menos, porque o sol é menos ofensivo. Lá dentro, a potência cerebral de pequena ostra é menos posta à prova, minto: quase nunca é posta à prova. As pedras ali atiradas doem tão pouco sobre a carcaça de pequena ostra. Resiste-se mais, pranta-se menos, vedados os olhos ondulados de pequena ostra. Essa é pequena ostra; dentro dela não se atingem as barbaridades, as cores da moda, o peso da moda, a dança da moda, a macaquice humana da moda, pois dotada de uma percepção incompreensiva a despeito das coisas do mundo de fora; pequena ostra torna-se constantemente desaprovada para esses rituais. Inicialmente, por conta própria, segundamente pela desistência insaciável das não-pequenas-ostras. Na imensidão que não a de dentro dela, a pequena animalzinho seria apenas mágoas, seria pedaço de maçã comida sempre e nunca maçã por completa, querida, vistosa. Pense que se você sequer margeasse os fluídos que se passam por dentro do lado esquerdo do peito de pequena ostra, você jamais lhe pleitearia com tanta displicência o alcance ao lugar em que nunca se chega. Então você se apropriaria de uma culpidão imensa, em seguida se corroeria com as doenças psíquicas que pequena ostra carrega desde-então-nem-sei-quando. Nessa instância, mediocridade versus amplitude se mediriam e o mundo todo saberia do que venho tratando. Um ataque de tristezas o comoveria e um esgotamento tremendo se espalharia, assim como o mar fora um dia aberto, a vermelhidão da dor que pequena ostra vem carregando a converteria em carne viva. Ainda não se sabe, mas a sensação prevista se equivale ao amargado pelos incrédulos em pós-tempos de Jesus e a descrença generalizada em sua filiação divina. Pequena ostra é uma espécie de Jesus das ostras, de quem chacotam todos vocês, mas é amanhã? Depois de superadas as crucificações; as renegações às pompas, os Judas aos cântaros. Mas é depois? Fato é que pequena ostra sabe antes de todos que é sozinho que se está na vida, é pequena ostra quem mais acredita na incapacidade de dois ou mais corpos serem coincidentes. Por essa conta, a pequena vem se esgotando da insistência das frouxidões dos outros; da reverberação de bocas em seus disse-me-disse-não-disse; do esticamento das adolescências, ainda que as mais profundas rugas se avultem, saltem aos olhos. Tem-se pequena ostra enojado das melindras intelectuais; dos teatros circenses para que apenas uma auto-história seja encenada; da língua nervosa que anseia o calar de vozes da alteridade, em favor de sua própria elucubração. Pequena ostra já descobriu que no fundo se é todo descontínuo. No pulo do gato, é que os sopranos se revelam, é que as calças se enchem de desarranjos intestinais. É no fundo do poço, que se tornam desnecessárias as exposições, as belezas artífices, os bem-sucedidos cifrões. No fundo da ostra tem se na conta uma ostra você também. No fim, a gente morre é sozinho. 

terça-feira, 8 de maio de 2012

Sobre as pessoas e Bob, o lagartixo


Primeiro os lóbulos são esquentados. Depois as bocas se afilam. No mundo das lagartixas ansiosas, é entre a barriga e o soluço que os pensamentos obsessivos se instalam. Um parasita zunindo para sempre os tornou espadaúdos lagartixos. Em seguida e do lado de fora, um grande gozo é certo a respeito de uma vitória lá de dentro inalcançada. Ninguém sabe de nada, apenas o lagartixo Bob e os-que-não-são-o-lagartixo-Bob. A verdade é que não se ensina um lagartixo a se espraiar. Sua natureza é avessa ao arreganho, a lagartixa come arainhas, é branca, pudica. É por detrás das grandes lentes lagartíxicas que os olhos evitados se apequenam em favor de uma grande fadiga universal que grita. Mas só todas as demais lagartixas restantes não se apercebem disso tudo. De repente não se fita desesperadamente em forma de aprovação, passa-se adiante, ligeira; apenas. Lagartixinha com rabo miúdo entre - pernas rapidinho. Passa através do pano vermelho taurino. De repente o balbucio é a melhor resposta, menos as desconexões que se enraízam nos sorrisos catastróficos. Era apenas lá confuso que se implorava. Sem indagações, sem perturbações e sem constatações babosas. Era a feiúra, era a gordura, eram pontas duplas e acnes evidentes, era a desocupação. Uma lagartixa toda defeituosa. Era o conselho, era o primo de um amigo lagartixo bem-sucedido, era a piedade da coisa apenas passageira, as lentes tristonhas das lagartixas idosas, sem vida. Era a desnecessidade de tanta coisa que a linguinha de Bob, o lagartixo se ressecou. A cauda solta era uma espécie de desarranjo intestinal das lagartixas. Um suor inundante os seus pezinhos transparentes.  De que gargalhavam os tortos. Por que agradeciam a deus. Não, mas não eram as provocações de lagartixa da vez. Primeiro havia o desejo intempestivo de que o coração de Bob fosse comido entre a transparência de seu corpinho. Para isso a questão em voga era destilá-lo. O porquê de sua esquisitice. Porquê de sua escamosidade. Porquê dessa lagartixice toda. 

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Da falta de um filtro


O entortamento voluntário de grampos. O rompimento intempestivo das cornetinhas. O desligamento das máquinas que concebiam a respiração. No filtro cabiam os sentidos mais profundamente lúcidos. E nele se enganchavam os mais vívidos pesadelinhos de sangue. A abelha ronronante se enveredou na cabeça como um balão bolante cheio de gás hélio: um estouro se deu. Duas gotas de abstinência se pelejando uma conta a outra. Uma queda sem fim, flutuante e ligeira, para sempre. Eu tinha um filtro em que meu Deus era uma força imensa. Uma baita de uma mucosa verdejante. Às vezes e de vez em quando, uma escapadela de surto se permitia e os cornos cresciam nas aves e eu podia sentir como se fosse bom a pele sendo infringida no pico mais alto dos chifres. E eu nem me lembrava mais a razão primordial de tanto filtro. Sem o filtro, as morceguinhas voltaram a se debandar para o lado dos corações infartados nas costas. Pois era lá que se minara até o centro deitado dos suspiros das princesas. O filtro me tolhia das ranhuras mais dispensáveis e das socializações acanhadas. Uma tremura sem fim é um sacudimento de pescoço apertado. Os ansiolíticos me trouxeram até aqui, sem que sequer um desentendimento se anunciasse. Agora há um sono eterno que não nos deixa cumprir as solenidades mais bagatelas, sem que a sudorese venha à tona. Há uma boca no tudo-tudo e um conjunto de ventres no nada-nada. Lado a lado, como que fundidos a luz de um mesmo dorso. Há uma inércia que desabilita as papilas, convertendo-as em vômitos e diarréias. A vida que se põe pra fora é proporcional a que fora entalada no filtro. Na falta do filtro, vive-se.

terça-feira, 20 de março de 2012

Aforismos e afetações

Quando tratar de afetos, salpique-se sem fim. Frutifique-os como um cão no cio sem fim de amores. Os apegos poucos assim que declarados insuficientes, quando se vão, levam-te. E não há mais nada que seja pesado às suas mãos do que aquilo que não mais é. É, pois, (não) sê-lo o que mais dói. Porque não há nada que fornique mais do que o sexo retirado de um só. Não há o que fira mais do que a faca que não está. Instale-se por entre muitos corações, os povoe à torto e à direita como uns gatos favelísticos sempre tão noticiados. Não pense em choque mais eletrocutante do que aquele lançado aos pés que plainam cuidadosamente sob a superfície d’água, mas que ainda não são Jesus. Não pise em ovos quando se trata de apego. Amarrote-os. Cansei um pouco.